– Ricardo! É a segunda vez que chamo você. Na terceira, vamos conversar de outra maneira.
A voz da mãe de Ricardo era firme e ela usava um tom que o fez parar numa poça de água e arregalar os olhos.
O dia estava quente, e a chuva veio repentinamente. A turma da rua estava reunida jogando futebol – todos cansados e suados. A chuva chegou como um presente. A garotada corria, tentava beber água da chuva, brincava de pega-pega.
Logo, as mães começaram a chamar:
– Luizinho, saia da chuva, menino.
– Mateus, entre agora. Quer pegar um resfriado?
Só restavam Ricardo e Rafael correndo e pulando poças.
– Ei, Rick. Melhor entrar. Sua mãe já está brava – ponderou Rafael.
– Daqui a pouco. Vou só pular mais esta… E esta… – Ricardo gargalhava. Que delícia sentir a chuva geladinha no rosto.
– Esse Ricardinho! Sempre desobedecendo. Ah, menino, se eu fosse sua mãe…
Era a vizinha que tinha corrido para recolher as roupas no varal.
Rafael se despediu. Como ele morava na rua de cima, ainda aproveitou por um quarteirão inteiro aquela chuva inesperada.
– Ricardo Augusto. Entre! Agora!
Ih… A mãe do garoto havia perdido a paciência.
Ricardinho entrou correndo, direto para o banheiro. Tomou um banho bem demorado na esperança de que a mãe se esquecesse da desobediência. Mas as mães têm memória muito boa! Assim que Ricardo entrou no quarto, encontrou a mãe sentada na cama.
– Filho, não tenho mais o que falar com você. É tanta desobediência! Parece que você gosta de castigo. Sendo assim, mais uma vez, você está de castigo: sem sair de casa para brincar até sexta. Sem choro e sem papo.
Ela se levantou e saiu. Nem deu tempo de Ricardo se pronunciar. Ele se jogou na cama, cansado do futebol… Chateado com o castigo. Ainda era terça-feira e naquela semana não teria aula… Uma punição e tanto!
Mas Ricardinho não sabia que o castigo seria ainda pior. No dia seguinte, a tia passou cedinho em casa. Todos estavam tomando café da manhã. Ricardo estava emburrado, mas logo desemburrou. Ele gostava muito da tia e dos primos Alice e Tiago.
– E aí, pessoal? Chegamos na hora certa. Que mesa bonita! – Tia Lúcia pegou uma maçã. – Não vamos demorar. Só passei aqui para ver se o Rick quer ir à praia conosco. Voltaremos amanhã, no fim da tarde. Que tal?
Todos na mesa seguraram a respiração em suspense.
– Que pena! O Ricardinho anda muito desobediente e ontem eu o coloquei de castigo. Ele não poderá ir – respondeu a mãe com um tom lastimoso.
– Mas, mamãe, foi a senhora quem me castigou. Cancele o castigo e pronto! – disse Ricardo espertamente.
Todos se entreolharam. Não tinha negócio. O castigo estava dado. Tia Lúcia foi embora levando o cheirinho de mar.
Ricardo foi para o quarto, triste. Praia de novo, só nas férias de verão.
A tarde passou depressa entre gibis, livros e álbuns de figurinhas. O rapazinho resolveu ir à cozinha para tomar um suco e ouviu os pais conversando:
– Não se culpe, querida. Não se chateie. O Rick precisa aprender a ser mais obediente.
– Eu sei. Mas ele ia se divertir tanto com os primos… Eu me sinto tão…
– Eu entendo, meu anjo, mas é um momento importante para ele. Fique calma.
Ricardinho pensou: “Eu perdi o passeio na praia e minha mãe é que está triste? Estou confuso.” Apressou o passo e entrou na cozinha. Não queria ficar ali escutando conversa sem autorização. Olhou nos olhos da mãe e viu que ela realmente estava chateada.
Papai passou e acariciou os cabelos do garoto. Ricardo caminhou lentamente e abraçou a mãe.
– Mãe, me desculpe. Eu não sei o motivo da sua chateação, mas sei que tenho culpa.
Mamãe sorriu e se abaixou para olhar o menino nos olhos:
– Estou triste porque você não está me obedecendo e muito triste por você não poder aproveitar a praia com a Tia Lúcia. Mas não posso cancelar o castigo… Você entende?
– Não entendo muito bem…
– O castigo também é uma prova de amor. Quero que você amadureça, aprenda novas lições. É como o sinal de trânsito: se você ultrapassa quando o sinal está vermelho, é um perigo! Se não acontecer nada pior, ainda vem a multa. Nossos atos têm consequências.
Ricardo respirou fundo, e mamãe completou:
– Obedecer também é uma prova de amor.
Ricardinho entendeu. Não era uma lição fácil. Papai entrou de surpresa:
– Há outra prova de amor aqui. Não está sentindo o cheirinho?
Os três disseram juntos, em coro:
– Bolo de cenoura!
Aquela semana foi excelente. Ricardo passou mais tempo em casa, jogou com o pai, aprendeu alguns acordes no violão, brincou de blocos de montar com a mãe e na sexta-feira era um novo garoto. Esperto como sempre e obediente como nunca!
Texto: Vanessa Meira
Ilustração: Ilustra Cartoon