Os desenhos de Bentinho eram bem legais. Quando ele terminava uma obra-prima, corria para mostrar aos pais, irmãos, professora e amigos da escola. Gritava aos quatro cantos com todas as letras:
– Olha, fui eu que fiz!
Todos queriam desenhar igual! Mas essa era uma inveja boa, sabe?…
Agora, dor de cotovelo mesmo era a do Nico, que não sabia desenhar como Bentinho e desejava mesmo era destruir as casinhas, fazendas e cidades coloridas na folha de papel sulfite, mas nunca conseguia! Sempre aparecia alguém para dedurar o aluno invejoso.
Nico foi um dos melhores amigos de Bentinho, mas nos últimos tempos estava muito estranho…
Num belo dia, Bentinho desenhou uma águia bem bonita. Ela era enorme, bem colorida e voava sobre o céu azul entre as montanhas. A ilustração passou de mão em mão entre as crianças da classe, onde todos admiravam o lindo dom do famoso desenhista da escola. Mas, não se sabe por que cargas d´água, o desenho foi cair em cima da carteira do Nico. Quando ele se preparava para aprontar das suas, surgiu o flagrante:
– Nico, o que você pensa que vai fazer?!
Era a voz firme e severa da professora Júlia ralhando com o menino ciumento.
O garoto nem teve tempo de responder. Ficou nervoso, vermelhinho da silva, olhou dos lados e viu que todos o censuravam. Aí não teve jeito, chorou às pitangas! Chorou tanto que suas lágrimas borraram todo o desenho de Bentinho. De um jeito ou de outro, Nico acabou conseguindo o que queria, mas o que surpreendeu foi a atitude do dono do desenho:
– Nico, não precisa chorar, vamos brincar! – disse Bentinho, não querendo aborrecer ainda mais o colega.
– Brincar de quê? – perguntou Nico, entre soluços.
– De consertar desenho!
– Brincar de consertar desenho?!
– É! Veja – demonstrou Bentinho, utilizando um giz de cera de cor azul. – Se pintarmos todo o papel manchado, vamos criar um lindo oceano. Olha só! – explicou ele. – Onde antes era um céu azul, agora é um mar azul!
– Mas a águia se afogou?! – perguntou o arrependido e assustado Nico.
– Não, a águia voou pra bem longe quando você chorou. Agora só existe um imenso mar e, dentro dele, muitos peixinhos e outros animais marinhos. Não é um desenho muito bonito – justificou Bentinho –, mas foi o que deu pra fazer. Nada fica perfeito quando se remenda…
A professora Júlia e os alunos presenciaram admirados o carinho e a compreensão de Bentinho. A emoção foi maior ainda quando o humilde desenhista deu a sua obra de arte retocada para o novo amigo.
Em posse da pintura, o garoto, agora mais calmo, não perdeu tempo. Já que não era um bom desenhista, deveria proteger muito bem o presente de um artista. Então, conseguiu dinheiro com seus pais para que pudesse emoldurar o desenho e protegê-lo para sempre.
Passado um bom tempo, o quadro ainda resiste na parede do quarto de Nico, trazendo muitas recordações.
O melhor de tudo é que, assim como Bentinho, existem muitos restauradores de desenhos espalhados pelo mundo inteiro. Mas tão bom quanto consertar uma amizade é mantê-la sempre protegida…
Mesmo não sabendo desenhar, Nico tem muito orgulho do quadro dependurado na parede de seu quarto, como se tivesse sido pintado por ele. É claro que não foi, mas quem inspira o autor é o cúmplice principal da obra de arte!