Léo! Levante-se, filho. Você precisa limpar o quintal e fazer a tarefa da escola.
Leonardo já estava acordado. Ele estava tentando adiar o inadiável.
Toda manhã o menino acordava com a esperança de que o quintal não estivesse sujo com o cocô do cachorro da família. Mas o Quincas fazia cocô. Sempre! E latia. E comia as meias do varal, rasgava toda e qualquer peça de roupa que estivesse dando sopa.
Quincas já estava com dois anos. A família gostava muito dele, especialmente Luana, a irmã do Leonardo. Aliás, o Quincas foi presente de aniversário de cinco anos da menina.
Quando o cachorro chegou, filhote, Luana se apaixonou imediatamente por ele. Mas o menino resistiu:
– Um cachorro? Isso é presente que se dê, tia?
Todos sabiam que o Léo tinha medo de animais. Todos os tipos de animais. Mas, aos olhos do garoto, os cachorros eram seres amedrontadores, cheios de dentes e prontos para morder.
O tempo passou, e o Quincas se tornou parte da família. Mas, como o cachorro era da irmã, Leonardo tentou trocar de função:
– Mãe! Já que o Quincas é da Lu, é justo que ela limpe a sujeira dele. Eu seco e guardo a louça do almoço e faço o que mais você quiser.
– Sua irmã ainda é pequena.
Ela não sabe limpar bem, e o quintal é grande. Vamos esperar ela crescer um pouco mais.
Leonardo sentia raiva.
– Odeio cachorros! Detesto animais.
Ele pensava alto.
No dia do banho do Quincas, era aquela confusão. Leonardo ficava muito bravo de ter que ajudar.
– Corre lá, Léo. Pegue o Quincas, por favor.
E ele ia, esbravejando. Trazia o mascote pela coleira. Respirava fundo e saía.
Numa noite gelada e chuvosa, a Luana estava com febre e tossia muito. Todos estavam apreensivos.
– Acho que vamos precisar ir ao hospital – disse o pai.
Luana respirava com dificuldade, deitada no sofá.
O Quincas uivava no quintal, como se soubesse que sua melhor amiga sofria.
– Cachorro chato. Já não basta a chuva? Já não basta a Lu doente? Precisa ficar lá fora incomodando?
Ninguém se importava com as reclamações do Léo.
– Filho, vamos levar sua irmã ao hospital. Você fica aqui. Fique atento. Não abra a porta para ninguém.
O menino sentiu um arrepio na espinha.
– Sozinho? Mas…
Ele não conseguiu nem completar a frase. Todos estavam dentro do carro. Papai gritou da janela:
– Tranque a porta. E não abra pra ninguém, entendeu?
Leonardo trancou a porta, trancou as janelas, fechou as cortinas e sentiu medo.
O vento assoviava, e o cachorro sossegou.
Léo resolveu ligar a televisão. O tempo passava devagar. O telefone tocou, e era a mamãe.
– Está tudo bem, filho. Sua irmã vai ser medicada e logo estaremos em casa.
A chuva caía fininho e, antes que o garoto colocasse o telefone no gancho, ouviu um barulho na janela.
Leonardo viu uma sombra andando lá fora. Era alguém, um estranho.
O menino muito assustado só teve tempo de fazer uma oração quando ouviu um latido forte. Quincas nunca tinha latido daquele jeito. Era um latido de cachorro bravo. Daqueles que faziam Leonardo morrer de medo!
Ele tomou coragem e acendeu a luz da varanda. Ainda deu tempo de ver o vulto de um homem alto pulando o muro em direção à rua.
Leonardo ligou para a polícia. Os policiais chegaram junto com seus pais.
Não tinha muito o que dizer. Afinal, Quincas, o herói da noite, havia deixado o ladrão tão atarantado com seu latido que ele fugiu.
– Não é muito comum um ladrão por essas bandas, mas vamos vasculhar tudo e duas viaturas ficarão na região à disposição.
O policial saiu pisando forte. A chuva tinha parado.
Quincas, todo molhado, veio abanando o rabo e se encostou em Léo. O menino, meio relutante, passou a mão no pelo espesso do animal. Sentiu um carinho imenso.
– Se você não estivesse tão molhado, ganharia um abraço, Quincas.
Todos riram.
Mamãe abraçou Léo com força. Luana, do sofá, sorria aliviada.
A lua reapareceu entre as nuvens, e Leonardo continuava acariciando o Quincas.
– Obrigado, Quincas. Você é muito corajoso!
Leonardo entendeu o ditado que diz que o cachorro é o melhor amigo do homem. Mesmo que algumas vezes o homem não entenda e não considere assim, os cachorros são amigos leais.
Léo descobriu que gostava muito de animais, mas o medo o impedia de fazer amizade com eles.
Agora, o menino não acorda com a esperança de um quintal limpo. Ele espera realmente que esteja sujo, pois é sinal de que seu amigo mais fiel está ali.
Texto: Vanessa Meira