Nina estava encolhidinha no sofá, os olhos vermelhos de tanto chorar e, com as duas mãos na boca, dava sinal de que não queria conversa.
– Filha… Não dificulte as coisas. Vamos conversar um pouco?
– Hum, hum…
– Tudo bem! Sei que você está muito triste, mas quer saber? Eu também estou. Queria conversar pra ver se o nosso coração se alegrava. Mas…
Nina tirou as mãos da boca. Soluçava.
– Mãe, a casa nova é muito longe daqui?
– É sim, filha, não vou mentir. Mas, se você, o papai e eu ficarmos felizes por estarmos indo juntos, tudo vai ficar mais fácil. Lembra-se de quando chegamos aqui, nesta casa?
– Lembro… Ela parecia maior. Até meu quarto encolheu.
A mãe sorriu, sentou no sofá, segurou a pequena mão gorducha de Nina. Ela sempre dizia coisas engraçadas assim.
– Nada aqui encolheu, mocinha. Você é que cresceu depressa. E para ir à escola? Uau! Como você chorava… E olha só! Agora a gente está chorando porque não quer ir embora.
– Mas, mãe… Agora tem a Marina, a Luiza, o Matheus… Eu gosto deles. E a professora Karina?
– É… A mamãe fez amigas também. Eu tenho um emprego superlegal, que é exatamente no seu horário de aula. Tão difícil deixar tudo para trás…
– Então, mamãe. Por que temos que ir? Os olhos de Nina começaram a se encher de lágrimas outra vez.
– Porque o papai vai trabalhar em outro lugar agora. E nós vamos começar tudo de novo em outra cidade.
Um silêncio gelado se aproximou das duas, até que a mãe voltou a falar.
– Nininha… A gente sabe para onde está indo. Já escolhemos uma casa bem bonita e sua escola nova é maior do que a atual… Agora, pense em Abrão.
– Quem?
– Abrão, que depois passou a se chamar Abraão, lembra? Deus mandou ele sair de onde morava, deixar a família e ir sabe para onde? Para um lugar que Deus ainda ia mostrar.
– Eu sei. Assim: “Abrão, saia de casa e comece a andar pela rua. Vou mostrar a você o lugar certo só quando chegar lá.”
– Isso mesmo. E sabe o que mais? Ele obedeceu e foi.
Nina estava com os olhos vermelhos, mas bem abertos. Prestava muita atenção.
E a mãe continuou:
– E, depois disso, Abraão se tornou o pai da fé, salvou o sobrinho Ló da destruição de Sodoma e foi um homem muito rico e abençoado. Abraão não teve medo da mudança e nem do desconhecido, sabe por quê? Porque ele conhecia e confiava em Deus. Será que nós duas conseguimos confiar em Deus também? Confiar que Deus vai nos levar exatamente para o lugar que Ele sonhou para nós nesse momento?
– Acho que sim – disse Nina, sem muita certeza.
– Olha, meu bem, a vida é como uma mochila. Nela não cabe tudo que queremos levar, só o que precisamos. E, quando a gente ganha uma coisa nova, tem que abrir a mochila, retirar um objeto antigo para dar espaço ao que acabou de chegar.
Nina estava entendendo:
– Mas não precisamos jogar fora o antigo para ter o novo, não é, mamãe?
– Claro que não. O objeto antigo só não vai estar tão próximo mais. Não se preocupe! A Marina, a Luiza e o Matheus vão continuar sendo seus amigos. Só não estarão tão pertinho. Sua professora Karina também vai sentir sua falta, e vocês podem se corresponder por e-mails, cartas…
– É… Eu sei.
Os olhos de Nina já não estavam tão vermelhos.
– Filha, o amor faz contas diferente da Matemática. Quanto mais a gente divide o amor que há em nós, especialmente o amor de Jesus, mais ele se multiplica. A gente divide e ele se multiplica, entendeu?
– Nunca fui boa em Matemática – Nina sorriu. – Mas estou entendendo.
No dia da mudança, Matheus, Luiza e Marina levaram uma grande caixa vermelha, cheia de laços e fitas. Era um presente para Nina. Junto havia um envelopinho rosa, escrito: “Para Nina, com carinho”, da professora Karina.
Nina entrou no carro segurando forte a mão da mãe. Ainda deu tempo de olhar para trás e ver seus amigos sorrindo e acenando para ela.
Como Abraão, Nina confiou que estava indo para um bom lugar. Ela se sentia mais forte, e sabia que muita coisa boa estava para acontecer.
Texto: Vanessa Raquel