Manchinha

Olhos verdes, cabelos castanhos, pele parda e pelos fininhos acobreados cobriam seus braços e pernas. Ítalo sempre gostou de jogar bola, subir em árvores e brincar. A vida simples na cidade pequena permitia se refrescar na cachoeira e soltar pipa. Mas algo triste aconteceu: seu pai estava muito doente. Um dia, enquanto brincava, um vizinho veio correndo:

– Você precisa voltar para casa. Depressa!

Chegando em casa, a mãe lhe disse:
– Hoje seu pai não voltará para casa. Ele precisou ficar no hospital. Você precisa fazer companhia para seus irmãos, para que eu possa ir até lá, tudo bem?

Ele concordou. As horas pareceram uma eternidade. Quando a mãe voltou, chegou também a notícia:
– O papai vai precisar de tratamentos melhores.
Por isso, teremos que nos mudar para uma cidade maior.
Foi o que aconteceu. O pai foi transferido de hospital, e todos tiveram que se ajustar a uma nova vizinhança.
Um tempo depois, começaram a aparecer manchas brancas no corpo de Ítalo. Apareceram no rosto, nas mãos, nos pés e até em seu cotovelo. Depois de alguns exames, veio o diagnóstico:

– Vitiligo! É uma doença que causa despigmentação da pele, pela ausência ou diminuição de melanina. Não é contagioso. Vamos aguardar, para ver se as manchinhas somem.
A médica perguntou se havia histórico familiar da doença. A mãe se lembrou: a tia Dora tem vitiligo, e o dela já estava bem avançado.

– É preciso ter uma alimentação saudável, evitar ficar muito exposto ao sol, usar essas pomadas que estou receitando e fazer terapia – concluiu a médica.
O vitiligo de Ítalo provavelmente havia sido “despertado” por causa dos últimos acontecimentos: a doença do pai, as mudanças – tudo isso causou estresse e o deixou preocupado e ansioso.
Na escola, os colegas lhe colocaram um apelido: Manchinha. Ítalo voltou para casa cabisbaixo. Não quis jantar. Seu irmãozinho percebeu os pontos brancos no seu braço e quis saber:

– O que é isso, Talo? Dói?

Uma lágrima rolou dos olhos do garoto. Ele balançou a cabeça negativamente, deu um beijo na testa do irmão e foi dormir.
Na escola, o apelido já havia se espalhado. Algumas meninas e meninos olhavam curiosos para ele. Houve até quem se afastasse na hora do recreio, talvez com medo de que aquilo fosse contagioso. Parecia que todos olhavam para ele.

Percebendo a inquietação da turma e a angústia do menino, a professora o chamou para conversar:

– Não se preocupe! Eu tenho uma ideia.

No dia seguinte, tiveram uma visita. Era uma dermatologista.
– Hoje, quero apresentar a vocês o Sr. Vitiligo –  disse tirando um fantoche com diversas manchinhas na pele. –
Ele não é contagioso, mas 1% ou 2% das pessoas no mundo o tem. Ele deixa na pele manchas branquinhas, que não doem, mas podem doer no coração. Se a pessoa for excluída, apontada ou receber um apelido maldoso, isso dói muito!
Todos permaneceram atentos enquanto o fantoche tentava esconder suas manchas. Ela continuou:
– Muitas crianças têm vitiligo; por genética, por desenvolverem doenças autoimunes e até por fatores emocionais. O apoio de amigos é essencial, e pode até ajudar a melhorar.
No recreio, alguns colegas pediram desculpas ao Ítalo. A partir daquele dia, o garoto ficou mais otimista com o tratamento. Agora, seus amigos o apoiam. E, melhor do que tudo, com manchinhas ou sem elas, eles o aceitam como ele é, sem medos e sem preconceitos.

Texto: Elza