Estranhos sentimentos

Quando Duda chegou da escola naquela tarde, logo percebeu que havia algo errado. Na cozinha, a mãe conversava baixinho ao celular, enquanto as panelas exalavam o bom cheiro do almoço.

A menina não entendeu muito bem o que a mãe falava, mas conseguiu ouvir algumas palavras que logo deixaram bem claro que algo ia mal.

– Tio Juca – falou a mãe – mas talvez tenha sido melhor assim.

Tio Juca era muito querido, desses engraçados que conseguem transformar qualquer reunião de família em uma festa inesquecível. O que teria acontecido com ele?

Assim que a mãe desligou o telefone, percebeu a presença da Duda. A menina olhava para a mãe com curiosos olhos castanhos, esperando que ela lhe dissesse o que estava acontecendo.

Então a mãe tirou o avental, apagou o fogo das panelas e chamou Duda para uma conversa muito séria na sala.

Mamãe a pôs no colo, apesar de ela já ser bem crescidinha para isso, e carinhosamente começou a falar:

– Dudinha, você se lembra da história de Adão e Eva?

– Sim – respondeu a garota desconfiada. – Deus criou os dois, colocou num jardim maravilhoso, que era o Jardim do Éden.

– Isso mesmo. E você sabe o que tinha lá?

– Animais de todos os tipos e muitas árvores: laranjeiras, macieiras, amoreiras, jabuticabeiras, parreiras…

– E uma árvore especial – interrompeu a mãe. – A árvore da ciência do bem e do mal. Você se lembra do teste de obediência? Eles podiam comer de todas as frutas, menos daquela ali.

– Mas Eva desobedeceu.

– Não apenas ela; Adão também. Desde aquele dia, todos nós, que vivemos na Terra, passamos a conviver com uma coisa muito ruim que não existia antes: a morte.

Duda começou a entender onde a mamãe queria chegar.

– Querida, você se lembra do tio Juca?

– Claro que sim, mamãe.

– Ele ficou muito doente algum tempo atrás e a tia Antônia me ligou para avisar que ele infelizmente morreu.

Mamãe não pôde mais conter as lágrimas.

Duda não sabia exatamente tudo o que aquilo significava, mas também sentiu uma vontade inexplicável de chorar.

Mãe e filha se abraçaram bem forte e ficaram assim por algum tempo até que a mamãe resolveu dizer algo.

– Duda, um dia, Jesus vai voltar e nosso querido tio Juca voltará a viver, mas, enquanto esse dia não chega, temos que nos lembrar de que ele teve uma vida muito feliz. Ele estava sempre animado, fazendo a felicidade dos outros. Ele realmente soube viver!

Juntas, elas começaram a se lembrar de como ele era querido por todos.

Tinha mania de levar sempre umas balinhas coloridas em formato de bichinhos para as crianças. Duda gostava muito e a mãe disse que ele já fazia isso desde que ela era criança.

Ele tinha sempre uma história engraçada para contar, uma risada gostosa pra dar, um beijo estalado pra sapecar na testa da gente.

Então, mãe e filha entenderam que a tristeza de perder o tio Juca era grande, mas a alegria de ter convivido com ele era muito maior.

– Duda, me prometa que vai tentar levar a vida sempre com alegria, como fez o tio Juca?

– Prometo, mamãe. Agora eu sei que o jeito como a gente vive a vida faz toda a diferença no fim.

 

Texto: Sandra Ferreira Barbosa

Ilustração: Ilustra Cartoon